quarta-feira, 20 de junho de 2012

Apito do Rio

Chineses na Central do Brasil antes do "Apito do Rio": 
Nem a buzina de todos os trens em operação conseguiram chamar a atenção para a ferrovia. 



Concessionárias e operadoras de transporte ferroviário mundial promoveram ontem o "Apito do Rio". O evento, promovido pela UIC(União Internacional de Ferrovias – Union International de Chemins de Ferre) tinha como intenção soar as buzinas das locomotivas do mundo inteiro as 20:00(horário de Brasília), de modo a chamar a atenção da sociedade acerca das vantagens e benefícios do transporte ferroviário em prol do desenvolvimento sustentável do planeta. 


Segundo a ANTF, participaram do evento as empresas:MRS Logística, Vale (Vale Logística Integrada - antiga FCA, Ferrovia Norte-Sul, E.F.Carajás e E.F.Vitória a Minas), Companhia de Transporte de Salvador, Trensurb Porto Alegre, Metrofor, MRN - E.F.Trombetas, MetrôRio e Supervia. Houve também a  participação da CPTM neste evento.

Na Supervia, todos os trens participaram do evento, inclusive unidades que não estavam em serviço. No Twitter, foi relatado apitaço de unidades no pátio de Japeri, Deodoro e em trens circulando no momento exato do evento. Neste vídeo, gravado por David Rodrigues na Central do Brasil no momento do evento, podemos ouvir bem a buzina dos chineses, que possuem o som mais forte e grave dentre todos os trens operantes na Supervia. 


Em São Paulo, foi filmado o apitaço na estação Brás, porém bem diferente do  que foi visto no Rio:



Para quem estava presente na Central, ou tem alguma ligação com o meio ferroviário, a iniciativa foi ótima. No entanto, o dia seguinte ao evento demonstra a total falta de visibilidade dada pela mídia ao "Apitaço":



Estes dois links mostram os dois únicos telejornais que relataram acerca do evento no dia do ocorrido, absolutamente imparciais(para não dizer outra coisa) relatando o evento. Não achei na internet nenhum outro link vinculado após a ocorrência do evento, em meio a várias notícias acerca de índios, protestos ambientalistas, peitos de fora e esquemas de segurança da Rio+20.  Enquanto um se importou mais em criticar a Supervia com relação a seus problemas, outro recebia piadinha acerca da poluição sonora causada por menos de 2 minutos com todas as buzinas dos trens sendo acionadas. 

Isso serviu para demonstrar a falta de importância dada no Brasil ao transporte ferroviário. Num país dito por 6ª maior economia do mundo, mas que sucateou grande parte de sua malha ferroviária e continua a assim fazer.Um país estupidamente dito por rodoviarista, mas que tem estradas em péssimas condições, fora a vergonha mor chamada Transamazônica e a clássica BR-101. Um país que se incentiva a produção de carros a rodo para fugir do transporte público, onde slogans para "deixar o busão lotado e comprar uma Honda" alimentam a contrariedade entre o povo e o transporte público. Num país onde um político que um dia foi pretendente a Presidência da República afirma que os ônibus congestionam o trânsito da cidade de São Paulo não podíamos esperar algo diferente. 

Imagens acerca do transporte urbano na exposição "Humanidade", um dos eventos promovidos na semana do Rio+20, no Forte de Copacabana.

O transporte público tem seus problemas, e a eles não podemos isentar a culpa por essa migração a opções mais errôneas que alimentam os congestionamentos, que são os carros. Além disso, os velhos conceitos acerca dos períodos decadentes do transporte ferroviário de passageiros refletiram e refletem nessa escolha, caso do transporte ferroviário carioca que de 1984 a 1998 passou a transportar 5 vezes menos passageiros, um decréscimo de 1 milhão de passageiros diários para menos de 200 mil ao final de concessões estatais, onde a culpa evidente foi da falta de trens aliada a manutenção deficitária e investimentos escassos, fora as atitudes de vandalismo.

Unidade 722 em Bento Ribeiro: Apesar de ser uma unidade modernizada com ar-condicionado, para o usuário sempre aos trens estará atrelada a imagem dos trens sem ar e lotados.

Contudo quanto menos pessoas se importarem com essa causa, os problemas continuarão a existir e a falta de investimentos no setor sempre será recorrente. E assim vamos trocando o que é nosso de direito por um tolo e falso comodismo equipado com ar-condicionado, MP3 Player e 5 lugares para você dirigir sozinho. 


Colaboração: David Rodrigues, Rafael Inglez, website da ANTF. 

terça-feira, 5 de junho de 2012

Reformas inconvenientes

Unidade 724, primeira unidade reformada: 
Problemas recorrentes, fruto de reforma mal-conduzida. 

A Supervia promete que irá reformar 73 trens. Para isso, contrata a T'Trans e a MPE para execução dos trabalhos nas Séries 700 e 500. O tempo previsto de reforma para os mesmos, segundo a própria Supervia, é de 6 meses, para que não haja um grande déficit de frota e para que os passageiros tenham mais rapidamente essas unidades equipadas com AC em serviço.Todos esperam a execução de trabalhos semelhantes aos feitos pela Alstom e IESA nas 18 unidades reformadas com ar-condicionado, bancadas pelo Governo do Estado. 


 Aviso no 724: melhor representação da vergonhosa reforma dessas unidades.


Até aí nada demais, até a chegada dos primeiros. Um trabalho rápido e mal-feito, para não dizer decepcionante.A T'Trans pecou demais na reforma dos mesmos, e a Supervia também, por ter requisitado isso tudo na reforma dos mesmos e assim ter comandado uma "modernização parcial"(como diz a T'Trans).Eis o porquê.

Modernização?

Nos 700, tudo mudou. Um grande "duto" foi feito no lugar que era ocupado pelos ventiladores, no entanto a distribuição da ventilação é desigual, só nas extremidades dos carros a refrigeração é sentida, demonstrando determinada falta de planejamento no projeto desses dutos. Alguns revestimentos repintados, não me surpreendeu muito se for levar em conta que o material usado na revitalização feita pela Alstom em 2001 ainda estava em boas condições. 



Interior do 700 reformado: Pequenos detalhes fizeram a diferença. Janelas seladas melhorariam bastante o aspecto da unidade.



As janelas "guilhotina" foram mantidas e seladas, sendo que 4 janelas por carro foram mantidas com a possibilidade de abertura em caso de falha do ar-condicionado. E recorrentemente elas são abertas. Fora isso, as janelas de policarbonato escurecidas caíram mal, apesar da boa proposta de minimizar os raios solares na unidade. Ele não preza pela iluminação natural do dia, e sendo de tamanho diminuto, obrigam que a iluminação do salão de passageiros esteja sempre ligada. Além disso, ele proporciona um efeito "interessante": A quem vai embarcar de dia, não consegue-se ver como o trem está por dentro, já quem está dentro do trem consegue ver o lado de fora. Já a noite, o efeito contrário: quem vai embarcar consegue ver como o trem está por dentro, já quem está dentro do trem não consegue ver nada do lado de fora. 



Janelas: Possibilidade de abertura, algo até então inimaginável em um trem "com ar-condicionado". 
Escurecidos, criam problemas aos usuários e limitam possibilidade da iluminação natural nas unidades.



Uma nova máscara foi colocada, mas em cima da máscara original do mesmo. O para brisa "panorâmico" acaba por ressaltar as três janelas que faziam parte da máscara original, mostrando que, para o condutor, nada muda com relação aos 700 existentes, inclusive nos comandos de condução, sendo mantida toda a base do que já tinha sido feito pela Alstom. A nova máscara inspirada no design dos trens coreanos, no entanto, tem sua beleza. 


Inspirada nos coreanos, a nova máscara é uma iniciativa de melhorar a máscara frontal das unidades.



A grande reclamação é com relação ao ar-condicionado: A Supervia instalou equipamentos de ar-condicionado comumente utilizados em ônibus!! Apesar de serem duas unidades por carro, é óbvia e bem percebida pelos usuários a ineficiência dos mesmos, apesar de serem os mais potentes equipamentos da empresa Spheros(A ficha técnica dos mesmos estará no final deste post). Tais equipamentos são ineficientes em horários de rush, principalmente em comparação aos equipamentos utilizados nos novos trens chineses, coreanos e 18 reformados do Governo do Estado. A sua refrigeração é somente eficiente em horários de menor movimento, em ramais como Belford Roxo e os serviços paradores do Deodoro e Bangu, onde a lotação é normalmente composta por passageiros sentados, algo em torno de 50 a 65, e contando com eventuais passageiros em pé, gira em torno de 70 a 80 passageiros/carro. 

Equipamento de ar-condicionado utilizado em ônibus e colocado nas reformas dos trens da Supervia: 
"Solução" que se transforma em problema. 

Sobre o equipamento de ar-condicionado: Claro que é possível a intervenção para colocação de um equipamento mais potente e semelhante ao que já é utilizado nos 700 reformados da Alstom, que também tem a vantagem de reduzir custos e padronizar a manutenção. A colocação de janelas seladas é a coisa mais simples a se fazer, e com certeza melhoraria a estética da unidade. A Supervia se ateve mais a estética do que a funcionalidade e boa operação da unidade, no entanto cometeu erros imperdoáveis nos dois quesitos.Fica evidente a redução dos custos de reforma para a escolha destas características. Além disso, as unidades até agora reformadas já apresentaram vários problemas, desde elétricos a comuns problemas com o ar-condicionado. Resta saber apenas se a Supervia vai corrigir esses erros e se está disposta a corrigí-los. 

A luz azul indica avaria ou problema no equipamento de ar-condicionado, nas unidades reformadas da T'Trans. Precisa dizer mais alguma coisa?

Há também a reforma dos 500: feita pela MPE, seguiu os mesmos passos dos 700, com a colocação de equipamentos de ar-condicionado semelhantes a ônibus, e janelas originais seladas. Como ele ainda opera pouco e eu particularmente não fiz viagens nele até agora, me recuso a dizer alguma coisa sobre os mesmos, para evitar conclusões precipitadas. Por isso, eles serão assunto de posts futuros. Ainda há a esperança de que isso não se repita nos 900, e que se faça uma reforma de verdade daqui em diante nas unidades restantes. Encerro com a ficha técnica do aparelho de ar-condicionado instalado nos 700. Até breve.

Aerosphere Tropical 350/Ficha Técnica

Capacidade Máxima: 135.000 BTU/h (40 KW) 2 equipamentos/carro.
Volume de Ar do Evaporador: 6.300 m³/h
Gás Refrigerante: R 134a
Dimensões (C x L x A mm): 2.880x1.920x220
Peso Aproximado: 198 kg
Compressor (modelo/capacidade): Bitzer 4NFCY / 647 cm³
Peso do compressor com polia: 48 kg



sábado, 2 de junho de 2012

Sinais da nova sinalização

Unidade 3005 passando pelas balizas já instaladas em Marechal: 
Sistema estará instalado no ramal Deodoro até outubro.


Quando a nova gestão da Odebrecht Transport assumiu a Supervia no ano passado, uma das suas maiores promessas foi a da instalação do novo sistema de sinalização. Em maio de 2011 ela anunciava o acordo com a Bombardier Transportation para a instalação do ERTMS, uma sigla para European Rail Traffic Management System(traduzindo, sistema europeu de gestão de tráfego ferroviário). O sistema Cityflo 350 da Bombardier permitirá a redução dos intervalos e a minimização da falha humana que vem a acarretar em acidentes, tal como o acidente de Austin, que poderia ter sido evitado caso o sistema de sinalização carioca não fosse obsoleto. O sistema CTC - Controle de Tráfego Centralizado - é eficiente, no entanto para a redução do headway e aumento da capacidade, seria um empecilho, assim sendo necessária a sua modernização. 

Sinaleiros e balizas em Marechal Hermes: 
fundamentais para o bom funcionamento da nova sinalização.


O novo sistema está sendo instalado em Nível 1. Nesse nível, as "Eurobalises"(balizas) instaladas na via transmitem a sinalização semafórica do trecho para a cabine do condutor. Também são transmitidas informações acerca do perfil geométrico da via, fazendo com que o sistema instalado na cabine de bordo faça os cálculos de aceleração e frenagem considerando as características da unidade e a velocidade selecionada para o trecho, para uma atuação segura aproveitando o máximo da unidade para oferecer uma melhor capacidade operacional e diminuição do headway.

Balizas instaladas em Madureira: 
detecção de trens e transmissão de informações da via para a cabine do condutor.

Uma unidade equipada com ERTMS precisa de dois tipos de informação sobre o estado da linha à frente: que velocidade ele pode fazer neste bloco e que velocidade se deve fazer no momento em que entrará no próximo bloco. Tais dados são captados por antenas localizadas junto ao trem, que são codificados e transmitidos por meio dos cabos e balizas .Eles consistem basicamente em dois dados, a velocidade autorizada do bloco e o código de velocidade do bloco seguinte. O diagrama abaixo mostra como isso funciona.



Códigos de velocidade serão configurados de acordo com a velocidade permitida no trecho e a sinalização semafórica existente. Neste exemplo, a unidade 2 opera sobre o código 40/40, ou seja, a velocidade transmitida e autorizada ao condutor é de 40 km/h neste exemplo. Para o bloco A4 ele recebe o código 40/25, uma vez que ele deve entrar no bloco A3 a 25 km/h. Já no bloco A3 ele recebe o código 25/0, já reduzindo para frenagem plena para evitar a sobreposição do bloco A2 e evitar acidente com a unidade 1, uma vez que tal bloco está servindo de referência para uma frenagem segura. Caso a unidade 2 transponha esse bloco, a frenagem de emergência é imediatamente acionada e evita a tração da unidade até que a unidade receba nova codificação para prosseguimento da viagem. Esse sistema é denominado por overlap de bloco absoluto, onde os dois blocos(A2 e A1) precisam estar livres para determinar a nova codificação, para que haja o prosseguimento da unidade que está parada no bloco A3. 

  
Apesar da idade, os sinaleiros(Das marcas General Rail Systems, Fresinbra e Daido/Mitsui) serão mantidos pela eficiência e robustez. 
Acima, sinaleiros japoneses Daido em Deodoro.
Abaixo, sinaleiros GRS na Central instalados em 1932!
80 anos de eficiência.(Foto:Thiago Matarazzo)



Outro sistema de overlap é o replacing track circuit, mostrado na imagem abaixo. Há de se considerar a possibilidade do condutor adentrar no bloco A123 em sinal vermelho, mas ao visualizar o sinal A121 em amarelo ou verde, entender como autorização de prosseguimento. Para  evitar isso, existe um overlap dentro do bloco assim denominado, onde somente após a transição da unidade 1 pelo  replacing track circuit  do bloco A125 , se autorizará assim a transposição da unidade 2 para o "bloco berço", onde de fato ele entraria no bloco A123. Tal sistema é utilizado em linhas de headway baixo, característica principal de sistemas metroviários. A vantagem deste para o bloco absoluto se apresenta na possibilidade de não utilizar um bloco inteiro para atuar como overlap, desperdiçando capacidade operacional. No entanto, o bloco absoluto é de mais simples instalação e abre a possibilidade de cálculo e realização de um overlap para cada sinal.O cálculo da frenagem de emergência, assim como os overlaps, como já dito acima, levam em consideração fatores como o perfil geométrico da via, a aceleração e frenagem máxima da unidade, de modo a proporcionar uma parada segura para os passageiros e evitar acidentes. 




Na figura abaixo, podemos exemplificar os três níveis do ERTMS:

ERTMS Nível 1: Convencional, atua por meio de balizas, localizadas junto aos semáforos de sinalização. (Ilustrações A, B e C)



ERTMS Nível 2: Atua pelas mesmas balizas, só que sem necessidade de sinalização semafórica, funciona por meio de sinal de rádio junto a unidade(Ilustração D) que avalia por meio das balizas se as seções estão livres para o tráfego.

ERTMS Nível 3: Ainda em desenvolvimento, sem necessidade de balizas e sinalização semafórica, o sinal de rádio atuaria junto a unidade como se fosse uma "baliza móvel". Permitiria dentre outros, um tráfego de maior capacidade e uma automatização maior do sistema.(Ilustração E).


Série 900 modernizado com ar passa por balizas na via dos diretos em Marechal: 
Trens com ar-condicionado e o novo sistema de sinalização otimizarão a operação, 
deixando a Supervia como um sistema de Metrô.


A Supervia afirma que até 2013 o sistema estará implantado em toda a rede. Em outubro será concluída a instalação do ramal Deodoro, em seguida os ramais de Japeri, Santa Cruz, Saracuruna e Belford Roxo. As plataformas fixas na Central do Brasil e a adoção do sistema de intervalos nos ramais Deodoro, Santa Cruz e Japeri tendem a acostumar desde já o usuário a essas mudanças e a otimização do sistema ferroviário, essencial para a melhoria do sistema. 



Agradecimentos: Thiago Matarazzo, http://www.railway-technical.com/sigtxt2.shtml , Fórum Skyscrapercity.